terça-feira, 24 de março de 2009

curso completo

(foto gentilmente cedida por Tomé Duarte)

Hora a hora, ouvi o meu uivo
durante a viagem toda. Desde o obscuro
à luzidia cidade, ao som acrescentei
o fiar da seda que me cobria
o rosto; ou o resto que não era dom
da imagem.

Foram dias lembrados, em movimento,
inventados pelos minutos que precederam
a hora a hora e agora inventa-os a memória. Não
há quem consiga estar aqui, neste buraco
que escavei com sem utensílios.

A viagem veio ter aqui. Lembro o perfume que este
pardieiro tem: rosmaninho, tu, pêlo, tu e um
suave amargo ao escuro do espelho que é
o tal resto de rosto.

Cada vez pior, cada vez mais torto, a concavidade
do sonho de estar aqui sozinho. Levantado, faltam-me
dois metros para a superfície: outra viagem até as unhas
desabrocharem no mármore. Fria
esta estrela da morte que me enrola
e serve de tecto nesta bolsa tenra
que me serve de estadia.

Tenho o coração no fundo e a cabeça
bêbada.

Continuo a escavar. Três metros
para o frio do mármore,
quatro,

cinco para o quarto que era meu. Olhos abertos no abismo
que é bolha envolvente em mim. Cada vez mais, cada
vez
menos.

Amanso-me com as armadilhas da vida. Sinto-o sopro
do final a chegar. Mais viagem, agora com as unhas,
rasparem até o sabugo sangrar.

Uivo. Raspõe e tira.

Canções múltiplas em mim, a mármore, o mármore,
já está tão lá em cima que lhe podiam desenhar uma lua.

Quarto minguante em mim. Natações de mão em mão,
íngreme, recta de vida a esmorecer
num resumo vertical

como este poema.

Todo eu sou brilho, reflexo do final que avisto
daqui. Serei uno com o centro
da terra., ponto uno com o universo.

Daqui à estrela será tanto como
de mim a ti.

O escuro ficará atrás da vida, talho
a matriz do meu umbigo
à chegada.

A radiação nas entranhas deste mundo
é louca. Explosivo à chegada, rasgo
a bolha com o canivete feito de osso,
e confundo-vos com a morte de dentro
e a morte de fora.

Todos os meus dias são submarinos,
tábuas debaixo da plaina
em direcção à origem. Eu sou

virgens
de uivos aos núcleos
da alma.
******

pedro s. martins

7 comentários:

  1. :) embriagante, querido pedro. um beijo.

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  2. vc se supera a cada quadro, guri. nu, quente, cabaleante, pedreiras, rios...
    ai, um mar de mim...

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  3. "Se tudo for feito com Amor e ingenuidade;
    Se todos se amarem mutuamente;
    Se a felicidade for uma Eternidade;
    Se a tristeza for mera passagem;
    Se a amizade for sincera e de Verdade;
    Se a vida for um Dar acima de receber;
    Então descobriremos que foi em cada uma desses
    momentos que nosso coração bateu mais forte,
    e que agimos pura e simplesmente como seres Humanos!"

    (Vera Costa)

    Desejo uma linda semana com muito amor.
    Abraços.

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  4. parabens mais um poema repleto de pura poesia!

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  5. obrigado a todos. uma recta em direcção à luz.

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  6. todos os meu dias são submarinos...............

    pois...........afundei faz tempo

    jocas maradas..sempre

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  7. Um dia há-de ser tempo de vires à superfície.

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