terça-feira, 28 de abril de 2009

de tudo a nada

(imagem gentilmente cedida pela Tamara - Urban Jungle)



Não sei se eras tu
ou o berço salgado,
apenas a presença
na língua de um bebé

como início de obra
a dois.

Pedíamos as despedidas e envelhecíamos
mais umas décadas. Arrepender-me-ia
se te negasse a ida ao avançar da idade
conjunta.

O bebé adolescente, o bebé
adulto e nós velhos a ficar até mais tarde
neste mundo que nos fugia debaixo
das rugas.

Podia morrer, ficavas sozinha com o nosso
filho. A feitura do início deste poema
está já em idade de ter um segundo começo.
Será que a minha presença ainda
é necessária?

Não é.

Reconheço que nunca aguentei estas letras de vida por ti.

Por ti, era velho
e frágil. E, no final de tudo isto, com o meu
entendimento rarefeito com a vida, poder-me-ei
suicidar em letras. Bem lá no fundo, sempre

reconheceste o meu desaparecimento
em pensamentos semeados em pedras.

Deixa-me, lentamente,
olhar a noite sem fim
e ir, simplesmente ir
por quem me chama

mais adiante

ao amar-te,

ou ao sentir (ou ao amar-te) o bebé em contraluz na fase adulta,
é a forma menos exagerada
de morrer por ti. Como eu não sou,
também
tu não és daqui: és de mim.

Divirtam-se na minha ausência corpórea.
******

pedro s. martins



4 comentários:

  1. O início de obra a dois. O passar do tempo. um amor que não foi(?) "tu não és daqui: és de mim". Muito bom!
    Um abraço.

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  2. mais um poema fantástico assim como todos os outros.
    parabéns

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  3. a contradição perfeita de sentir
    um quando se quer a dois

    belíssimo

    .
    um beijo

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