domingo, 21 de agosto de 2011

38.

E tinhas, afinal, olhos doentes,
o veludo das mãos já se esgarçava;
nem era inteligente o que dizias,
nem elegante o gesto que hesitavas.
Por sorte, algum mau gene imprevidente
te dera um vago encanto adolescente,
e o prestígio banal do invisível,
risível quanto seja, te aguardava.
Por isso me deixei prender; tentado
a ser o manso tolo do romance,
servi sem jeito inquietação a rodos.
Ah, afinal, o teu sorriso era trejeito,
a fala sem razão e sem nuance,
nem tinhas, numa mão, os dedos todos.

António Franco Alexandre, "Duende", Assírio & Alvim, 2003.

2 comentários: