sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

aquele amor

Da infância do renascimento até à tosca
arte de morrer é um passo em falso. Já
naveguei nessas plenas lufadas de vida
diversas vezes e em todas elas
me perdi a meio.

Agora, com oitenta e quatro anos outra vez,
sinto na pele ter falhado mais três ou quatro
saídas no caminho até aqui. Cedi os números
de contacto às velhas mais velhas que eu.
Nenhuma me ligou. Disse-me a cacofonia da rudeza
que todas elas alegaram estarem a praticar a tal
arte que já mencionei – meninos, falo-vos da rude
queda. Da rude queda. Da queda.

Queda.

Sou o filho
exilado nas gralhas de uma despedida
em suspensão.

Sou o pai
do decreto na maldade que esta janela mostra. Indaguem
esta espécie de ano humano e verão a suspeita
de uma presença oca patrocinada pela cegueira de
alguém que já acenou um adeus com a mão descrita
a seguir.

Eu, Horácio, tenho uma ruga em cada dedo e um dedo
por cada vez que abandonei. Juntos, somos o ano
de mil novecentos e noventa e seis e eu, catatónico de profissão,
fico aqui à espera da fasquia dobrável em mentalidades.

A tristeza está na vossa insistência em se partirem aos pedaços
de remoinhos cegos.
******

pedro s. martins

5 comentários:

  1. Tudo que cedemos volta para nós, mas nem sempre a tempo, e nem sempre a fonte é aquela para a qual direcionamos nossas ações.
    Queria entender essas coisas...
    É como se a vida fosse uma tv comprada com tres anos de garantia que se estraga justinho no 1o dia após o vencimento do prazo, pois investimos nela e nos decepcionamos sem acreditar no tamanho das nossas decepções.

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  2. Cada pessoa leva a vida como quer, outros preferem chorar, outro preferem rirem e n coisas mais...

    Mais nem que seja para se "partirem aos pedaços de remoinhos cegos", ainda seremos nós mesmos que assim escolhemos.

    Fique com Deus, menino.
    Um abraço.

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  3. Envelhecemos é nos redemoinhos da vida...
    um abraço e bom final de semana

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  4. Entro e permaneço ao sabor das palavras tantas.

    Na feliz sobrecarga da sabedoria.

    E saio, feliz, porque é certa a re.volta aqui.

    Sublime.

    E deixo-TE um abraço.

    Sempre,
    ____ p.

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  5. Paulo, o meu sincero agradecimento.

    É bom ver-te por aqui.

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