segunda-feira, 27 de abril de 2009

quando morre quando

(Da cidade - Maria João Lopes Fernandes)

Esta treva estática de veres uma paisagem
demasiado longínqua do que a minha,
faísca-me
selvaticamente pelas aberturas
do corpo
sem lirismos ou coxas.

São seis da tarde; são seis da manhã. Olá
e o hemisfério a dizer-me que o sono
acabou de desovar. Não quero estas
pessoas;
não quero estes cheiros;
não quero este ser e não quero
ser aparição diária em fuso errado.
Não quero um adeus a começar.
Queria saber-te como a nossa idade: palpável
palco de solidões encenadas.

Da espiral que ilustra este poema, Maria
João disse que ergueu uma casa e
no seu interior habitam memórias
onde percorre
a terra com os pés no chão.

Na espiral que açambarca a ilustração
em forma de poema, também
há uma casa construída por dentro dos olhos de quem
o escreveu, porém, nela não habita nada,
é vazia de passos
a indagar
o dia de amanhã em bocas negras
de doce tacto.

Sou alimentado por uma musa a quem este poema
é dedicado. Todos os dias e noites e madrugadas
sou abismado pelo alumiar que esta mulher provoca
em mim.
A abundância de talento é tal,
que dou por mim a querer partilhar blindmelon
com as mãos fixas à sua volta. Ponto a ponto,
a morosa aproximação da sua presença cirúrgica
no meu pensamento aproxima-se,
queimando-me o poema,
queimando-me as letras,
salvando a aguarela debaixo
do braço e aí vou eu, e aí vem ela.

As fendas luminosas de abandonar o poema doem,
mas, a ser verdade tudo o que disse até aqui sobre
ti,
a felicidade de haver calcinado hemisférios
de ruptura suplanta o mundo, onde apenas ficavam
as mãos
entre o abismo e a paixão.
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pedro s. martins

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